Meritocracia, economicismo, liberalismo, sub-desenvolvimento…

As palavras do título desse post, e outras mais, estão no centro do trabalho do sociólogo Jessé de Souza. Nós começamos agora a nos aproximar do estudo desses conceitos, que permitem um olhar sobre características marcantes da sociedade brasileira.
A maneira pela qual nós voltamos nossa atenção é pela leitura do livro A ralé – quem é e como vive, que Jessé publicou em 2009. Um livro que já tem 10 anos mas que nos ajuda a compreender de forma bem clara o Brasil atual.
Na Introdução, Jessé de Souza indica que a forma de pensar alguns dos problemas brasileiros precisa ser revista. Ele escreve:
A impressão mais compulsivamente repetida por todos os jornais e por todo debate intelectual e político brasileiro contemporâneo é a de que todos os problemas sociais e políticos brasileiros já são conhecidos e que já foram devidamente “mapeados”. Que não se perceba nenhuma mudança efetiva no cotidiano de dezenas de milhões de brasileiros condenados a um dia a dia humilhante deve-se ao fato de que a desigualdade brasileira vem de “muito tempo” e que não se pode acabar de uma penada com coisa tão antiga.
E afirma que essas duas afirmações são falsas: são duas afirmações que naturalizam a desigualdade social que existe no Brasil. Elas gerariam a impressão, muito disseminada, de que o Brasil não tem jeito, que é assim mesmo…
Na realidade, a “legitimação da desigualdade” no Brasil contemporâneo, que é o que permite a sua reprodução cotidiana indefinidamente, nada tem a ver com esse passado longínquo. Ela é reproduzida cotidianamente por meios “modernos”, especificamente “simbólicos”, muito diferentes do chicote do senhor de escravos ou do poder pessoal do dono de terra e gente, seja esta gente escrava ou livre, gente negra ou branca. Quando não se fala dessas formas “novas” e “modernas” de se legitimar a dominação cotidiana injusta e se apela a uma suposta e vaga continuidade com o passado distante é porque não se sabe do que se está falando, ainda que não se tenha coragem de admitir.

E isso tem diretamente a ver com os jornalista e o jornalismo. Isso porque o jornalismo que se concentra em confundir análise com números (considerar que usar números, estatísticas é suficiente para tratar da realidade) esconde nossos problemas e as disputas que ocorrem em nossa sociedade.
Para Jessé, temos fetiche por números, a sociedade brasileira como um todo tem em seu imaginário um modo de pensamento economicista: interpreta a realidade a partir de dados, de forma quantificável. Essa perspectiva, redutora da realidade, é o que permite esconder nossos reais problemas.
Há outros aspectos dessa Introdução que veremos nos próximos psts e aulas. Por enquanto deixo vocês com a reflexão acima sobre a classe média brasileira e esse link na revista Cult, com uma entrevista com o autor de A Ralé.